Julieta Rodrigues

(única artesão que faz louça de Pinela)
Julieta Rodrigues, como tantas outras raparigas de Pinela, saiu da aldeia com apenas 17 anos, para emigrar para França. Não trabalhava no barro mas, na sua meninice e juventude, acompanhava vizinhos e familiares na arte da olaria, observava com interesse e conta que o barro sempre fez parte da sua essência. Por isso, quando regressou à terra, já mulher madura, decidiu recuperar aquela arte entretanto perdida.
Diz que trabalha por amor e com paixão, pelo barro.

 
Antes de emigrar já sabia trabalhar com o barro?
Não, nunca fui oleira, não! Mas com vontade sempre de poder mexer no barro, trazia qualquer coisa dentro de mim, que eu dizia ao meu marido, quando eu tiver os meus filhos grandes, eu vou trabalhar no barro e sempre com um bichinho a mexer que eu queria trabalhar no barro(…).
Não trabalhava o barro mas andei a ajudar a fazer cântaros, pois andei, a dar à roda, ajudei aqui a minha tia a trabalhar no barro. Na minha família a cantareira era a irmã do meu avô. Em geral quase todas as casas tinham uma cantareira e em casa do meu avô era a irmã dele. (…) Olhe, fiquei sempre com uma paixão de pequenina, por não me deixarem tocar na roda, fiquei sempre com uma paixão de poder tocar, e quando os meus filhos cresceram, foi aí que eu decidi mudar de vida, vim para o barro e o barro é qualquer coisa de mágico. Por dentro de mim há qualquer coisa que me diz que mexa com ele. Não se explica! (…)
 
E como aprendeu se já não havia cantareiras em Pinela?
Olhe, aprendi quando cheguei a Portugal. Os meus filhos estavam crescidos e eu fui ao Centro de Formação dizer que eu queria aprender a trabalhar no barro, disseram-me que não havia cá quem ensina-se. Propuseram-me ir para as Caldas da Rainha, mas os meus filhos andavam no liceu, não deixava os meus filhos uma semana inteira para ir para as Caldas da Rainha, disse que não podia ser. Uns tempos mais tarde, a responsável do Centro de Emprego e Formação Profissional repensou, falou com o senhor Presidente da Câmara e decidiu abrir um curso de cerâmica, vieram os formadores, um do Alentejo e outro de Coimbra. Ligaram-me a dizer que iam abrir um curso, se eu estava interessada, disse-lhes logo que sim e pronto fui logo no dia seguinte a inscrever-me. Fiz o curso de cerâmica de 1997 a 1999.
 
E regressou com as Cantarinhas de Pinela à Feira?
Sim, desde 1999 e mantenho-as até hoje.
 
Toda a sua louça leva a marca de Pinela?
Na minha louça, nas peças todas, sai um selinho que diz “Cantarinhas de Pinela”, com o nome da aldeia, é assim! Eu acho que já não há sitio nenhum por aí fora onde não haja um selinho onde diz “Cantarinhas de Pinela”.
 
Mas esta é uma arte difícil, dá muito trabalho?
Dá! Muito mesmo! O prazer é assim, há um ditado que diz que quem corre por gosto não cansa.
 
O barro dá-lhe felicidade?
Muita. Se andar em baixo, triste com qualquer coisa que não esta a correr bem, o meu refúgio é o atelier, é o barro, andar a mexer, a sentir; fecho a porta, começo a trabalhar no barro e fico muito melhor.
 
Gostava que alguém lhe seguisse os passos?
Gostava muito, muito! Tenho andado a insistir, seria para mim um enorme prazer ensinar o pouco que sei.
Pinela é a única aldeia onde as mulheres trabalham o barro, são as mulheres oleiras, porque noutros locais do país a olaria é uma arte dos homens. E quando nas feiras de artesanato por onde eu tenho ido, que têm sido muitas, digo que sou oleira, os homens oleiros ficam admirados. Até houve um sujeito que me disse: “O que é que fazem os homens na tua terra? Se são as mulheres que trabalham no barro, o que é que fazem os homens?” e eu: Pois, fazem outras coisas, mas no barro são as mulheres a trabalhar.
 
Neste momento está a peneirar o barro, já o colheu, já o secou e agora, pelo que vejo, do muito barro que trouxe pouco fica?
Pois fica! Numa saca de quatro baldes fica um balde de pó e três de areia (…) só que antigamente também vendiam esta areia, sabe? Era com ela que esfregavam os potes. Então depois, peneiravam outra vez aquela areia pelos crivos, lavavam-na bem lavadinha e iam pelas aldeias a trocá-la ou a vende-la para as pessoas esfregarem os potes, aqueles potes de ir ao lume. Havia sempre um caco com areia e um esfregão com sabão e era a coisa que punha sempre os potes mais bonitos, mais branquinhos, a brilhar. (…) Tudo se aproveitava. Ui! Quantas vezes eu tive que fazer isso, esfregar os potes, que a minha mãe me obrigava, e eu não gostava nada!
 
Fica apenas pó de todo o barro que trouxe?
Ficar como vê, sem impurezas, limpinho! (…) Está sequinho porque senão não passava na peneira! É uma peneira da farinha, se for muito grossa deixa passar a areia e depois o barro não dá para trabalhar. Este fica um pozinho, como se fosse farinha.
Depois de peneirado o barro vai ser amolecido em água, onde anteriormente já se dissolveu o “grosso” ou fermento, terra mais pastosa que dá consistência ao barro. Tem de se amassar repetidamente até formar uma bola, que deve repousar 48 horas para expulsar a água que que tem a mais. Depois fica pronto para trabalhar na roda e aí começa o processo criativo.
2015-06-08T16:36:54+00:00
(única artesão que faz louça de Pinela) Julieta Rodrigues, como tantas outras raparigas de Pinela, saiu da aldeia com apenas 17 anos, para emigrar para França. Não trabalhava no barro mas, na sua meninice e juventude, acompanhava vizinhos e familiares na arte da olaria, observava com interesse e conta que o barro sempre fez parte da sua essência. Por isso, quando regressou à terra, já mulher madura, decidiu recuperar aquela arte entretanto perdida. Diz que trabalha por amor e com paixão, pelo barro.   Antes de emigrar já sabia trabalhar com o barro? Não, nunca fui oleira, não! Mas com vontade sempre de poder mexer no barro, trazia qualquer coisa dentro de mim, que eu dizia ao meu marido, quando eu tiver os meus filhos grandes, eu vou trabalhar no barro e sempre com um bichinho a mexer que eu queria trabalhar no barro(…). Não trabalhava o barro mas andei a ajudar a fazer cântaros, pois andei, a dar à roda, ajudei aqui a minha tia a trabalhar no barro. Na minha família a cantareira era a irmã do meu avô. Em geral quase todas as casas tinham uma cantareira e em casa do meu avô era a irmã dele. (…) Olhe, fiquei sempre com uma paixão de pequenina, por não me deixarem tocar na roda, fiquei sempre com uma paixão de poder tocar, e quando os meus filhos cresceram, foi aí que eu decidi mudar de vida, vim para o barro e o barro é qualquer coisa de mágico. Por dentro de mim há qualquer coisa que me diz que mexa com ele. Não se explica! (…)   E como aprendeu se já não havia cantareiras em Pinela? Olhe, aprendi quando cheguei a Portugal. Os meus filhos estavam crescidos e eu fui ao Centro de Formação dizer que eu...