A Olaria de Pinela
No norte do distrito, no concelho de Bragança, encontramos notícia de duas olarias: em Pinela, onde nos anos 60 existiam ainda 6 oleiras, tendo falecido recentemente a última oleira em atividade, a Sra. Cândida Afonso; e em Vila Boa, localidade da freguesia de Serapicos, onde existiam nos anos 50 ainda 9 oleiras, mas em que se deixou de fabricar no início dos anos 70. As origens da olaria de Pinela são-nos desconhecidas, sabemos que já existia no século XIX e é provável que tenha início em período mais recuado, no entanto o facto de se tratar de uma olaria em que o trabalho é exclusivamente feminino e por vezes sazonal, deverá ter contribuído para o tornar menos visível na documentação antiga Trata-se de duas povoações vizinhas pelo que apresentam características técnicas idênticas. As principais referências bibliográficas a estes centros, principalmente a Pinela podem ser encontradas na obra do Abade de Baçal (ALVES, 1910-47: II, 476/7) e no já referido trabalho do Dr. Belarmino Afonso sobre olarias do distrito de Bragança (AFONSO, 1981). Caracterizam-se estas olarias pela utilização da roda baixa e pela exclusiva participação de mulheres no fabrico de cerâmica. Eram recolhidos duas qualidades de barro: utilizado em maior quantidade era o barro de Paredes que depois de seco, esmagado e peneirado era por fim amassado com água e misturado com uma pequena quantidade do barro fermento trazido de Izeda.
A oleira trabalhava geralmente ao ar livre, debaixo de um telheiro ou na rua, junto a casa. Embora se produzissem peças todo o ano era na Primavera e Verão que mais se trabalhava na olaria. As oleiras de Pinela utilizavam a roda, movimentada apenas pelas mãos, para produzirem a sua louça. A roda, fabricada em madeira de freixo ou castanho, é constituída por uma base quadrangular, em madeira, o cepo, no qual se insere um eixo vertical de ferro, o guilho, sobre o qual assenta o centro do prato da roda. A roda assenta ainda numa cruzeta de madeira, os machinhos, que facilitam à oleira movimentar a roda. A roda e os machinhos são solidários e giram em torno do guilho que se encontra fixado ao cepo. Sobre a roda é fixado, com um pouco de barro (a maia), um pedaço de madeira quadrangular a galga, sobre o qual a oleira coloca o barro a trabalhar. Tem uma altura total de 30 cm e o prato tem um diâmetro de 46 cm. No fabrico das peças, a oleira utiliza pequenos instrumentos que a auxiliam na modelagem do barro, no alisamento das peças e na execução de motivos decorativos e que são comuns à maior parte dos oleiros: o fanhadoiro – pequena tabuinha em madeira, e a coura – pedaço de pano que molhado no testeiro (pequeno alguidar com água), ajuda a alisar as peças. As peças mais pequenas: púcaros, barrinhões e cantarinhas (pichorrinhas) são feitas de uma só vez. Quando se trata de peças maiores: cântaros ou panelas, a oleira fabrica a peça em três fases. Primeiro o fundo – caco, depois o bojo da peça (boujaro), e finalmente o colo, asas e bordo. Entre cada uma das fases a oleira deixa a peça secar para poder mais facilmente aguentar com o resto da peça. Por vezes, quando se trata de fabricar peças maiores, a oleira é auxiliada por outra oleira ou por um elemento mais novo da família, que movimentam a roda enquanto a oleira fabrica a peça. Cada oleira possuía um sinal próprio que colocava, normalmente na asa da peça, e que permitia a identificação das peças na altura da cozedura. Por exemplo: uma pequena cruz, uma linha ondulada, uma aspa e duas incisões. Uma vez terminadas as peças são colocadas a secar nas varandas ou na cozinha, variando o tempo de secagem com as condições climáticas, podendo, no Inverno, demorar cerca de um mês. Não existem em Pinela as grandes talhas características de outras olarias, nomeadamente do Felgar, é provável que essa ausência seja devido ao facto de nesta região não abundar nem o vinho nem o azeite, os dois produtos que eram armazenados, por excelência, nas talhas. Por outro lado a execução das grandes talhas exige grande perícia técnica e alguma força física. Nesta olaria é também costume a execução de pequenas miniaturas de peças, principalmente de cântaros e alguidares, destinadas a serem vendidas na Feira das Cantarinhas, em Bragança, que tem lugar no dia 3 de Maio. Eram utilizados fornos comunitários, de duas câmaras e com cobertura abobadada. A louça apresenta tons amarelados, sendo peças mais características os cântaros, de colo alto e esguio e corpo baixo e largo e os alguidares de bordo reentrante. Estas olarias assumiram uma importância significativa, pelo menos nos séculos XIX e XX, abrangendo na sua área de comercialização os concelhos de Bragança, Macedo, Vinhais, Vimioso e Mirandela. Dos testemunhos recolhidos fica-nos a ideias de que embora frequentando as mesmas feiras, as oleiras de Vila Boa tinham como área de comercialização preferencial a freguesias situadas a Sul, enquanto as oleiras de Pinela distribuiriam as suas louças pela zona situada mais a Norte.
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Fonte: RODRIGUES, Miguel Carlos Areosa (1996) – A Olaria no Leste Transmontano, Porto